lundi, juin 20, 2011

Filme do dia: Um gato em Paris (Une vie de chat)

Foi o segundo filme que eu assisti no festival Varilux. As duas primeiras exibições tiveram um debate com o diretor Alain Gagnol. Também teve uma sessão ao ar livre no leme, com a presença dele, à qual, infelizmente eu não pude ir.

Ao contrário de "Uma doce mentira", o debate de "Um gato em Paris" foi excelente. Tavez porque o público presente estivesse verdadeiramente interessado no filme, e não em tietar gente famosa. Na verdade eu até me arrependi de não ter filmado. Uma coisa que me entristeceu um pouco foi o número pequeno de crianças na audiência. Tenho certeza que se fosse o filme do Justin Bieber, ou algum enlatado americano a sala estaria entupida de pais com seus filhos. Depois o povo reclama que brasileiro não tem cultura e mimimi...Claro, com a criação que a molecada recebe...Mas as crianças que estavam lá me deixaram orgulhosa. Sério, além de se comportarem muito bem, fizeram perguntas superlegais para o diretor. 

Muito da contextualização e informações que estão nesse post se originam desse debate.

"Um gato em Paris" é um filme de animação para crianças que os adultos podem assistir na boa (apesar de eu achar uma babaquice essa idéia de que adulto não pode ver desenho animado, qualquer um que conheça animação sabe que boa parte do que é produzido hoje em dia não só agrada aos adultos como é direcionado para eles. Mas no Brasil ainda se tem essa noção besta de que desenho animado=filme para criança. Culpa da Disney). Na verdade é mais inteligente e bem-resolvido que muito filme para adultos que eu tenho visto ultimamente. O gênero escolhido para a produção já a torna interessante para começo de conversa: "Um gato em Paris" é um filme noir. Isso mesmo, um filme policial estilo noir para crianças. Alain Gagnol, roteirista e diretor do filme, tem uma carreira paralela como escritor de romances "polar" (como os franceses chamam o romance policial ou de suspense). Isso é uma tremenda vantagem para o filme, já que Gagnol, conhecedor do ofício que é, fez uma trama bem amarrada, simples o suficiente para ser atraente para os pequenos, mas ao mesmo tempo complexa o bastante para prender a atenção dos adultos.

Aliás, nem precisava dizer que o roteirista é autor de romances policiais. Basta assistir o filme para ver que os realizadores tem muita intimidade com o estilo. Todas as referências clássicas do gênero noir estão lá: as tomadas urbanas e noturnas, um policial que deseja vingança (no caso uma policial, Jeanne), um vilão megalomanícao brincando de gato e rato com os mocinhos, um herói charmoso, uma "femme fatale" dissimulada... Enfim, "Um gato em Paris" é quase uma homenagem ao gênero.




Como o título indica, a personagem principal de "Um gato em Paris" é um gato que se chama Dino. Dino leva uma vida dupla. Durante o dia ele é o gato de estimação da pequena Zoé, filha da delegada Jeanne. Mãe e filha estão passando por um momento difícil: o marido de Jeanne e pai de Zoé, um policial, foi morto durante uma operação. Ele foi assassinado pelo célebre gângster Victor Costa, um maluco violento que continua à solta. Jeanne jurou prender o responsável pela morte do marido e vê uma oportunidade ideal quando  fica encarregada da segurança da exposição de arte que mostrará a estátua "Colosso de Nairóbi". Jeanne tem certeza que Costa tentará roubar a obra, e se prepara para pegá-lo. Por outro lado Jeanne e seu parceiro Lucas também tem que investigar uma série de roubos a residências que vem ocorrendo por toda a Paris. Como a mãe está sempre trabalhando, Dino é a única companhia da solitária Zoé, tão traumatizada com a morte do pai  que parou de falar desde então. 

O que Zoé e Jeanne não sabem é que, depois que todos vão para a cama, Dino vai encontrar seu outro "dono", Nico. Nico é o responsável pelos roubos à residência que a mãe de Zoé está investigando mas, apesar de ser um ladrão, é um homem de bom coração e cheio de simpatia. Nico é quase um ninja que pula de telhado em telhado(numa referência à prática esportiva do parkour), invadindo casas na calada da noite sem ser percebido, roubando sem nunca usar de violência. Nico é um típico anti-herói de filme noir: o ladrão charmoso e de bom coração. E o gato Dino é seu parceiro de crime. Mas os ladrões Dino e Nico acabam tendo que se tornar heróis quando Zoé é sequestrada pelo bando de Costa. 

O grafismo do filme tem um charme à parte. Além das referências óbvias ao filme noir clássico dos anos 40, que transparecem nas tomadas "externas" de noite, cheias de jogos de luz e sombra,  letreiros luminosos, tipos misteriosos escondidos em vielas e outras marcas do gênero, também é possível notar um quê de arte na coisa toda. É fácil entender porquê: em debate Alain Guignol nos disse que o filme foi produzido com apenas 12 animadores trabalhando com materiais tradicionais como lápis, papel, lápis de cor e pastéis. Ou seja o trabalho foi praticamente "artesanal" e com o mínimo de interferência digital. Isso qualifica o filme, facilmente, como uma obra de arte.

Mas o mais interessante com relação ao grafismo está no estilo. Jean-Loup Felicioli, responsável pela parte gráfica não é um simples animador: ele se formou em nada mais nada menos que quatros escolas de arte, em Annecy, Estrasburgo, Perpignan e Valence. A formação clássica dele é visível em "Um gato em Paris", não apenas cada quadro do filme foi desenhado com técnicas tradicionais, mas cada detalhe ganhou atençao especial, as diferentes paletas de cor (em especial a dualidade noturno/azul/preto e diurno/amarelo/laranja/vermelhos), a iluminação detalhada e cheia de profundidade, e a óbvia referência ao estilo de Picasso no design de personagens, cenários e perspectiva. Mais do que descrever vou deixar uma amostra que ilustra bem o estilo de "Um gato em Paris":





Enfim, o filme ideal  para assistir se você tem filhos, se curte uma boa história policial ou se gosta de arte. 

Algumas curiosidades:

Alain Gagnol teve a idéia para o roteiro quando morava no sul da França e, frequentemente, observava da sua janela, gatos sem dono pulando de telhado em telhado. Começou a se perguntar para onde eles iam, e o roteiro de "Um gato em Paris" surgiu de uma das idéias mirabolantes que teve.

Nem Alain Gagnol nem nem Jean-Loup Felicioli são originalmente de Paris. Gagnol é de Roanne e Felicioli de Albertville, ambas cidades da região de Rhônes-Alpes. Em debate Gagnol admitiu que fazer de Paris o cenário do filme foi uma maneira dos dois explorarem a cidade. Ele disse também que muitas panoramicas foram feitas propositadamente erradas a fim de "exibir melhor a cidade", assim em algumas cenas podemos ver muitas das marcas registradas de Paris como a Torre Eiffel e o Arco do Triunfo juntas, o que não aconteceria numa panorâmica verdadeira.

No mesmo debate Gugnol disse que a decisão de escolher um ladrão e uma policial (Nico e Jeanne) como heróis da história foi proposital. A intenção era fazer um filme para crianças que não tivesse a típica divisão maniqueísta de "bonzinho" e "vilão", preto ou branco, e mostrar que existem áreas cinzas (o que também é um elemento corriqueiro no filme noir, onde não há personagens completamente morais e imorais). O único vilão clássico da história é Costa ( interessantemente ele o único que mata uma pessoa-o pai de Zoé- o que o marca como verdadeiramente mau)

O personagens foram desenhados com lápis e lápis de cor, mas os cenários foram feitos com pastel oleoso, o que aumenta a sensação de obras de arte animadas.

A versão original contou com as vozes de alguns consagrados atores franceses como o também humorista Bruno Salomon (Nico), Dominique Blanc (Jeanne), Jean Benguigui (Victor Costa) e Bernadette Lafont (Claudine)

Links

Site oficial (em francês):http://www.uneviedechat-lefilm.fr/

Site pedagógico para pais e professores (em francês) :http://uneviedechat.crdp-lyon.fr/index.php




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